segunda-feira, 19 de outubro de 2009

O Quinto Império: Acordai, Portugal!

Vai para aí uma sarrabulhada mais disparatada....Ouvi há pouco na rádio que existia um qualquer abaixo-assinado (com a conivência vergonhosa da mais distinta apelidada imprensa nacional) exigindo lacrimosamente à embaixada brasileira para emitir um pedido de desculpas oficial por causa daquele Silly moment da Silly Maité naquele vídeo irrelevante gravado há 2 anos. E não é que conseguiram mesmo? Hein? Podem repetir? Mas haverá coisa mais saloia e paroquial de um Portugal absolutamente pequenino, moralista e complexado? Da nação da grandiloquência sebastianista, do cabo Bojador, da grandeza perdida da pátria, do Prof. Hermano Saraiva em tom cavernoso, do “deu novos mundos ao mundo”? Mas não haverá nada mais importante e que nos possa mover a intervir em semelhantes níveis de indignação? Algo que tenha a ver com assessores de presidentes da república, por exemplo... Mas foi nesta bagatela medíocre que resultou a ressaca noticiosa pós-eleicções? Preferia a Gripe A. É que, sem desconsideração, é só uma actriz de novelas!! Mas haverá melhor forma de se estimular o estereotipo que a Maité e muitos brasileiros sempre alimentaram de nós em piadas depreciativas? Estereotipo algo insultuoso, sim. Como em todos. Sem objectividade e sentido autocrítico, também. Que até tenho dúvidas que (os de lá) acreditem realmente nele, mais um misto de desprezo e ignorância. Mas a reacção de muitos portugueses a rasar o histerismo também veio a evidenciar a nossa falta de cultura democrática quando a crítica (que tentava o humor) vem de fora. E até um estereotipo que, aproveito para informar os melindrados nacionalistas, foi criado pelas próprias elites burguesas portuguesas que dominavam o Brasil oitocentista logo após a independência (sim, continuamos os melhores a gozar connosco mesmos). Um estereotipo baseado num preconceito novo-nacionalista, oriundo principalmente das metrópoles do Rio de Janeiro e São Paulo que recebiam as maiores massas de emigrantes portugueses logo após a abolição da escravatura. Emigrantes oriundos de famílias extremamente pobres do norte de Portugal que vieram a ocupar ofícios do pequeno comércio. E aí está! Gente pobre, iletrada e com a abundância de folículos pilosos em zonas recônditas característica de pessoas desesperadas que têm mais em que pensar do que em considerações estéticas. Gente “esquisita”, pensam as muitas Maités daquele enorme país. Mas infinitamente corajosa, principalmente. Estereotipo sem especial afinidade com o Portugal actual, também. Mas um estereotipo que nós, infelizmente anjinhos e paternalistas ou positivamente indiferentes e abnegados, nunca demos grande cavaco (termo escolhido casualmente). E a isto se poderia acrescentar ainda o óbvio do reflexo da medalha corporizada no estereotipo que conservamos do país do futebol, crime, samba e prostituição (ver comentários do Youtube ou fórum TSF). Mas este caso mostrou-nos ainda pior... Vai-se treslendo rapidamente os comentários ao vídeo e a reacção é ainda mais pavorosa. Fica-se absolutamente aterrado com o racismo latente... não só com os comentários dos portugueses, diga-se em abono da verdade. De ambos. E é que estão mesmo bem uns para os outros no nível de indecência. Dos comentários dos brasileiros ressalta um desdém que é típico dos países grandes. Uma arrogância enorme e ao mesmo tempo uma permanente desculpabilização: parece que tudo o que funciona mal no Brasil resulta de termos sido nós os colonizadores há quase 200 anos. E dos Portugueses, um complexo de inferioridade e provincianismo que é verdadeiramente confrangedor e inquietante. Eu acho que este episódio absolutamente irrelevante tem apenas uma pequena vantagem antropológica. Ajuda a dissipar alguns equívocos culturais que existem na relação entre os portugueses e os brasileiros (a sagrada mitologia dos países irmãos). De facto, tirando as novelas e a música brasileira que os portugueses consomem, os portugueses e os brasileiros não se conhecem - os portugueses sabem pouco da cultura brasileira, os brasileiros não sabem nada da cultura portuguesa (o que até é normal, dada a desproporcionalidade 1/20). Os brasileiros vivem mal com a sua história e isso tem a ver com a maneira como se relacionam com Portugal. E os portugueses também vivem mal com a sua história, mais isso já todos nós sabíamos ou então bastaria deslocarmo-nos a Santa Comba Dão. Mais, o caso evidencia que somos parecidos pelo menos num aspecto. Numa enorme falta de respeito que temos por nós próprios. Se a auto-estima dos portugueses é realmente abalada com uma pequenina cuspidela numa fonte do Jerónimos, então vou ponderar emigrar. Para a Argentina, provavelmente. E eu sou daqueles que, apesar de tudo, ainda prefere a Maité ao Scolari.

E o Cavaco, já falei do Cavaco?


Led

5 comentários:

ivan disse...

onde é que está o botão "like"?? eheh
muito bom texto matos. muito bom mesmo.

Jp disse...

Clap, clap, clap, clap.

Nuff said.

Ledbetter disse...

Nossa, guris!Mas alguém tinha de se chegar à frente para falar de assunto tão premente para o futuro do país.

Celeste disse...

Olha lá, e quem te manda andar a ler comentários no youtube?

Ademais, já te disse que devias mesmo emigrar. :)

Beiji*
PS: Eu tive um tio-avô que viveu 40 anos no Brasil. Chamava-se Joaquim e era comerciante. E, só por acaso, natural de uma aldeia nas redondezas de Santa Comba Dão.
Per isso...

Ledbetter disse...

Ahaha!
Tenho a certeza que o teu avô era um excelente comerciante.