quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Change We Can Believe In

O pior pré-julgamento criado com a entrada de Obama na Casa Branca será a expectativa de que a radicalização de posições em torno dos EUA diminua instantaneamente com o início de funções. Para já a mudança tem sido do campo do abstracto, todas as conjecturas permissíveis porque a política ainda passeia de mão dada com os chavões excelsos com os quais todos concordamos (a aura de optimismo atinge contornos raros: o seu índice de popularidade chega aos 84%). Mas o ódio institucionalizado anti-americano é ideológico e por isso de teor emocional. E não há razão iluminista que nos proteja da abnegação ao ódio grosseiro da última década. Por outro lado, a UE é uma Grécia antiga estiolada em jogos de sofismas. Sem unidade e sem capacidade de mobilização poderá recair no erro de deixar a iniciativa de resolução dos conflitos externos de novo para os EUA, a projecção formatada da nossa impotência e culpa reprimida no país do pragmatismo e dos hambúrgueres. E esta é uma das maiores mistificações do nosso tempo (e a mais sedutora). Mas um homem precisa de um mito para ir vivendo. E no meio de tamanha crise de valores que convivemos todos os dias (económica, política, social, religiosa, ambiental) e em face da hostilidade universalizada facilitada com a incompetência grosseira do período “W” dos últimos 7 anos, dificilmente descortino um caminho de ampla aceitação (como a que assistimos nos 2 meses precedentes) para a administração Obama ultrapassar os espinhosos obstáculos que se lhe deparam no horizonte imediato. Obama já tem um lugar na história pelo significado cultural da sua eleição mas o risco é tanto mais elevado consoante a fasquia gerada em torno dele. Será ele capaz de corresponder? Seremos nós capazes de o equivaler e de responsavelmente separar o essencial do acessório? Esperemos que sim. Num tempo de desnorte e descrença disseminada, acreditemos por uma vez que sim. Talvez seja esse meio caminho andado para a mudança que todos desejamos mas da qual ainda desconhecemos os reais contornos.

Led

2 comentários:

nuno disse...

a europa precisa dum presidente.

imaginas o que teria acontecido na geórgia se em vez da presidência rotativa estar nas mãos do sarkozy estivesse a hungria na presidência?
ou nós?
desta vez tivemos sorte.

mas precisamos dum presidente. um chefe da comissão não chega, é demasiado "europeu". e não o digo por estar là o amigo do bush, é mesmo pela posição em si.

que dizes a umas eleições para presidente da europa? pra nos deixarmos de mariquices e começar-mos a funcionar como um bloco decente em vez de andarmos a deixar os gringos botarem mísseis a troco de vistos na europa de leste.

Ledbetter disse...

Sim, talvez se a Hungria, República Checa, Estónia, Polónia ou a Eslováquia ou qualquer outro antigo satélite da ex-URSS estivesse à frente do conselho europeu as coisas tivessem sido bem mais complicadas. Julgo por outro lado que Portugal ter-se-ia dado razoavelmente bem como intermediário, tal como o fez aquando a sua presidência do conselho europeu.

Quanto à questão mais polémica e relativamente discutida de passarmos de uma união supranacional para uma união do tipo república presidencialista, como uma federação de estados e com um presidente único e omnipotente, acho que é uma questão muito complicada para te responder num só comentário. Depende exactamente do tipo de sistema adoptado e das negociações feitas principalmente quanto às questões financeiras. Não tenho uma opinião bem fundamentada mas acho de difícil execução dadas as particularidades culturais, políticas e económicas de cada país membro dos 27. Seria complicado imaginar uma convergência entre o Reino Unido, França e Alemanha numa solução deste tipo, dadas as suas constantes lutas hegemónicas pela influência na comissão e parlamento europeu (dois destes membros com a sua autoridade acrescida por serem membros permanentes no conselho de segurança da ONU). O Reino Unido principalmente, precisa realmente clarificar a sua posição em relação à Europa, não para se servir dela consoante as conveniências (a questão da moeda única ter sido recusada por lá é um indicativo forte sobre o que pensa realmente o Reino Unido da Europa). A questão relativa ao orgulho nacional é também demasiado capital para estes países para verem a sua vaidade histórica comprometida por um presidente forasteiro. Depois vem ainda a questão mais complicada, relativamente aos orçamentos e fundos para cada país. Mais uma vez, sabendo por exemplo da tensão cíclica criada entre a França (recebe mais do que contribui) e o Reino Unido (contribui mas do que recebe) nos fundos relativos à agricultura (PAC), seria extraordinariamente mais difícil imaginar os problemas que resultariam de verbas muito superiores, no caso de funcionarmos como uma associação de repúblicas e monarquias parlamentaristas e de recebermos simplificadamente consoante a população de cada país e o PIB contributivo. Muito, muito complicado. Não sei se os países pequenos como Portugal sairiam a ganhar ou a perder, dependeria realmente das negociações feitas. A União Europeia funciona como uma balança de poderes equilibrada pelos organismos do parlamento europeu, comissão europeia e conselho europeu. É neste equilíbrio oscilante de instituições com os seus próprios poderes que se tem tentado gerir o interesse comum em proveito de todos os seus membros, preservando simultaneamente as identidades e as especificidades nacionais e regionais de cada país (e que constituem a verdadeira riqueza da Europa). Uma coisa te digo, se nem com um simples tratado reformulador da constituição conseguimos acordo pleno, seria quase impossível imaginar esta questão ser viabilizada num referendo (certas constituições de certos países a tal obrigam e acho que aqui seria mesmo mandatório para todos os países membros). Se fosse hoje, aposto que mais de 80% dos países votaria contra uma solução minimamente credível desse tipo. A história da Europa tem sido feita de ciclos, dúvidas, erros, recuos e avanços e esta tem sido apesar de tudo uma das maiores virtudes desta união, todas as decisões sujeitas a uma escrutínio minucioso e uma ampla multi-negociação tendo em conta os deveres e direitos de cada elemento. Por isso não devemos estar demasiado deprimidos com a situação actual. Devemos reformar a constituição e tornar certos processos burocráticos mais agilizados e clarificados (por exemplo a questão de um único país ter a capacidade de inviabilizar toda uma maioria, como aconteceu com a Irlanda. Não concordo absolutamente com isto.). Sou a favor da criação de um ministro dos negócios estrangeiros (tal como estava enunciado no tratado de Lisboa) e do mui esperado exército europeu. Além disso veria como positivo o alargamento do mandato do presidente do conselho europeu de 6 meses para 2 anos, de modo a assegurar uma maior continuidade e estabilidade administrativa. Nada disto implica a criação de um presidente absoluto e a própria Europa pela sua ascendência de sangue e horror nunca veria essa ideia com bons olhos. Prefiro que vamos avançando e recuando como até hoje, precisamos é de reformar (e muito todos) os organismos legislativos. Por outro lado, historicamente as relações intra-europeias reflectem o que se passa do outro lado do atlântico. A convergência normalmente coincide com uma maior simpatia por quem estiver à frente dos EUA. Acho que agora, restabelecidas as relações euro-americanas, é uma excelente janela de oportunidade para a Europa fazer progredir a sua agenda interna e externa, enunciando de forma clara quais são as suas verdadeiras preocupações quanto às opções de Obama. O envolvimento dos EUA é uma condição prévia para o sucesso do projecto europeu.

Não sei se te respondi à questão, talvez sim, talvez não. Mas percebo o que te leva a conjecturar uma solução desse tipo e penso nisso muitas vezes. Precisamos de um rumo próprio e de uma maior estabilidade que associamos compreensivelmente a um único órgão de poderes. Mas talvez possamos contornar essa opção com uma reforma legislativa e agilização administrativa. Por outro lado, espero que tenhamos aprendido com todos os os falhanços recentes, sou da opinião de que mais transparência e abertura na eleição das pessoas para estes lugares melhora a legitimidade da união.

Abraço.