sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

A política da intimidação


O que escreveu Rui Tavares no último pingue-pongue com Helena Matos quando o assunto da teatral demissão de Alberto João Jardim veio à baila :

“E eis que em pleno Carnaval –apropriadamente- Alberto João Jardim se demitiu de chefe do Governo Regional da Madeira para logo se voltar a candidatar ao mesmo cargo. Implicitamente, admitiu que a realidade política em que ele se movia mudou de forma radical. Explicitamente, a mensagem que quer fazer passar é a de que só admite jogar segundo as suas próprias regras. Vejamos cada um dos aspectos.

Alberto João Jardim não é um brutamontes agressivo que diz tudo o que lhe passa pela cabeça. Alberto João Jardim apenas parece um brutamontes agressivo que diz tudo o que lhe passa pela cabeça. Essa imagem é crucial para os seus intentos. Nos intervalos, Alberto João Jardim pode ser manobrista, sedutor, surpreendente, um encanto de pessoa. Esta versatilidade permitiu-lhe sempre navegar na política nacional, com algum risco é certo, mas dividendos incomparáveis. Entalou os políticos nacionais e comprou o consenso dos madeirenses. Governou uma região como quis, com os recursos que quis, durante o tempo que quis. Nenhum outro político português se pode gabar do mesmo.

Subitamente tudo mudou. Sócrates foi eleito não apenas com maioria absoluta, mas uma maioria absoluta que dispensa os votos madeirenses. Não só Sócrates não precisava de Alberto João, como nem precisa de se preocupar com a eventualidade de vir a precisar. Foi aí que a arte da intimidação, em que Alberto João Jardim se especializara, deixou de funcionar.

Em que consiste a arte de intimidação? Em deixar os outros permanentemente suspensos, receosos das nossas atitudes. Tudo em Alberto João Jardim, desde a linguagem à retórica, denuncia alguém que se compraz em meter medo aos outros. Quando Alberto João se “porta mal”, pode enxovalhar, insultar, ameaçar. Quando Alberto João se “porta bem”, o que faz nos intervalos, sorri, brinca, lisonjeia. Mas mesmo aí os sues interlocutores continuam encolhidos, à espera da pancada. Alberto João Jardim manipula-os, prolongando o gozo, deixando-os na ignorância de quando virá o próximo acesso de agressividade criteriosamente gerido e encenado. Por isso os madeirenses que o rejeitam se calam em público e os que o apoiam o louvam o mais que podem. Por isso os líderes do PSD vão à Madeira a medo, receando que ele lhes prepare alguma surpresa. Por isso os jornalistas nunca o confrontam, com receio de desencadear uma fúria. Se ele estiver virado do avesso, salve-se quem puder. Se ele estiver um doce, pior ainda: não se pode relaxar.

Esta manha permite-lhe ocultar algumas coisas. Na verdade, já acabou o tempo em que o estilo de Alberto João Jardim beneficiava a Madeira; hoje em dia Alberto João é um peso morto que perdeu a batalha das finanças regionais, não tem amigos nem aliados, não consegue sair da cena por cima. Na verdade, Alberto João Jardim apresenta os continentais como ladrões e os seus rivais madeirenses como traidores precisamente para ocultar que ele, hoje, prejudica mais do que auxilia. Na verdade a Madeira teria a ganhar em ver-se livre de Alberto João.

Na verdade só há uma maneira de enfrentar a política da intimidação: não se deixar intimidar.”
Público 22-02-07

A registar!

Led

2 comentários:

Unknown disse...

Texto formidável com todas as razões nele apontadas. Sugiro que o Alberto João emigre para a Venezuela ou para a África do Sul ou para Jersey.

Hugzz!

Ledbetter disse...

:) Só não te lembraste da China como o exílio mais cómico!
Jersey, do canal da Mancha, não? Não desejaria tal desfecho ao estado (Garden State - será daí a ligação?) mais português dos USA. Venezuela, não sei se era boa ideia, mas percebo que o estilo peculiar de governação de Chavez possa suscitar um certo fascínio do Alberto João. Apesar da diferença de escala e cor política as semelhanças são manifestas.

Abraço.