sábado, 4 de novembro de 2006

A tarde finda, há luz no ar

E a certa altura, um prazer íntimo de nos aconchegarmos em nós, separados de tudo, defendidos de tudo, com um certo mimo rabugento na pele como quando acordamos pela manhã e ficamos ainda no choco, de sono ainda inserido em cada poro, aninhados e felizes. Um momento de felicidade, de bem-estar. Ser feliz nesta hora da tarde, com um sol outoniço que rompeu por entre a chuva e dourou o ar de pacificação. A casa fechada, a intimidade connosco, o mundo lá fora suspenso. Um instante de plenitude, mesmo o de quem esquece. Esquecer. Ser feliz no abandono deste silêncio luminoso em que a tarde finda devagar. Tanta coisa te ameaça e não sabes o que é. Ameaça surda, oblíqua, sem razão. Esquece. Prazer infantil, insinuada memória de um refúgio maternal, prazer subtil e finíssimo, alheamento breve do duro e constante combate de adultos. E que tudo em ti adormeça numa vaga evocação de não saber o quê, de um futuro inexistente e que é agora belo por não existir, que tudo em ti se entregue à nulidade que te suspende e fluidifica e evapora em dissipação. A tarde finda, há luz no ar, as àrvores recolhem-se a uma longa meditação. Dissipa-te e esquece. Sê feliz.
Led

2 comentários:

Tulipa negra disse...

Led no seu melhor: feliz, poetico e biografo de tudo quanto e' belo e luminoso. Um prazer!

Ledbetter disse...

:) Unfff...Tenho saudades tuas!
Grande beijoca!