sexta-feira, 30 de junho de 2006

O que os ingleses andam a pedir

”Ontem não se jogou para o Mundial e o centro nevrálgico desta coluna pôde ser parcialmente desactivado e submetido a operações essenciais de manutenção, como ir à praia, comer cerejas e estar com a família. Infelizmente o mau hábito de ler os jornais ingleses fez com que o Mundial viesse ter comigo.

Segundo o “Guardian” de ontem, os jogadores ingleses terão visionado um “video nasty” em que se exibiam e denunciavam as manigâncias e malandrices da selecção portuguesa. Suponho que os virginais futebolistas ingleses devem ter ficado chocadíssimos com as violências lusitanas, tendo alguns indubitavelmente desmaiado, quais tísicas raparigas numa estufa de lírios, necessitando de doses industriais de sais de cheiro para reanimarem os delicados organismos.

Ou seja: não obstante estas hipocrisias hilariantes e as ausências de Deco e Costinha, os ingleses estão aterrorizados. Já muito tinham sonhado em voz alta que Cristiano Ronaldo não se refizesse a tempo das afectuosidades holandesas e que a FIFA interviesse lá das alturas para pôr também o Figo de molho.

Mesmo assim, não estariam descansados. Porque o problema é mais Freudiano e menos futebolístico. Os ingleses adoram Scolari. Adorá-lo-iam de qualquer maneira, mas adoram-no mais ainda porque não podem com Eriksson, odiando-o sem estribeiras. Culpam-no de tudo e mais alguma coisa, incluíndo as entediantes e medíocres prestações da selecção inglesa. Enfim, fazem tudo menos pôr a hipótese que os jogadores ingleses têm pouco jeito para o futebol.

Uma parte profunda dos ingleses deseja, por isso, que Eriksson seja mais uma vez humilhado por Scolari, nem que a selecção inglesa tenha de perder com Portugal por causa disso. Os ingleses desejam aquele a que chamam “Big Phil” com a paixão de um órfão rancoroso que quer trocar o ratinho enfiado que o adoptou por um leão longínquo e poderoso que vê rugir.

É por estas e por outras que não podemos desiludir os ingleses no sábado. Não seria, como os ingleses dizem, “cricket”.

Temos de ganhar cruelmente, à tangente, no último minuto, desfazendo esperanças recém-nascidas, como eles gostam.
Porque é isso que os ingleses andam a pedir! “
Miguel Esteves Cardoso - O Jogo
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