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Hoje, a Europa e a América já se habituaram à matança do Iraque, que não comove ninguém e não ocupa mais do que uns segundos de noticiário. A “libertação” degenerou em guerra e a guerra em guerra civil quase sem se dar por isso. Não há estado. A farsa eleitoral e a “constituição” não produziram sombra de legitimidade. O exército dito eufemisticamente “aliado” não ocupa o terreno. Metido num arquipélago de zonas fortificadas, não se arrisca ( e não se envolve) no caos que o rodeia. Entretanto, por isto e por razões domésticas, os promotores da grande cruzada, Bush e Blair, deixaram de contar. Blair está a prazo e Bush chegou ao fundo da impopularidade. A América perdeu definitivamente a iniciativa. No Iraque, no Médio Oriente e até na Ásia defende um resto de prestígio e procura um atalho para se extrair sem excessivo custo dos sarilhos que ela mesmo arranjou.
Como era de esperar, e muita gente percebeu, o efeito da aventura do Iraque foi o contrário do que os neoconservadores previam: não enfraqueceu e dividiu o islão, enfraqueceu e dividiu o Ocidente. A derrota de Bush e Blair, ou se preferirem da América e da Inglaterra, permite agora a chantagem do Irão. Pior ainda, permite que o Irão, através do Hezbollah e do Hamas, que financia, arma e comanda, alargue a guerra entre Israel e a Palestina ao Líbano e não tarda, à Síria. A resposta a uma ofensiva falhada é, como as regras mandam, a contra-ofensiva. Nunca, desde que desapareceu a URSS, o Ocidente andou tão próximo de uma catástrofe. Curiosamente, excepto pelo preço do petróleo, nunca também o cidadão comum do Ocidente se interessou tão pouco pela ameaça eminente à sua bolsa e segurança. Vem aí uma verdadeira surpresa.”
Vasco Pulido Valente – Público, 15/07/06
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