Não, não tenho nada a dizer. Triste sina daqueles que se levam demasiado a sério pela blogosfera, como fogos fátuos. E porque hei-de ter que dizer seja o que for? Deduzidas mesmo as horas de dormir e de me distrair com o trabalho que me certifique de uma (incerta) aura de plausibilidade social, só raramente me passa uma ideia decente, um motivo interessante ao alcance que me impulsione para a partilha. Destas ideias esporádicas, só mesmo uma baixa proporção consegue atravessar o coador de constrangimento até chegar à divulgação a peito aberto. A vida humana é um enorme desperdício em saldo utilizável do que se vai vivendo. Como a matéria de que somos feitos, se reduzida no que é em intervalos, ela ficaria mais pequena de que um bago de arroz, no que se pensa de útil em proporção – ou nem isso. É espantosa a desproporção entre a massa brutal de superfluidades em que uma vida se consome e o quase nada que sobra a resumi-la toda. Mesmo os grandes homens, que é que fica em liquidação do que foram? Um acto ou uma frase, uma ideia, um composto, uma fórmula, a redescoberta do que sempre esteve oculto. Não sou grande homem, ficarei em paz na minha inutilidade bovina. Mas a vida está nas entrelinhas, diz-se. É bem verdade. Como nesta noite plácida e fria. Outono da quietação, do refluxo da vitalidade, do torpor morno e recolhido, do longo meditar. Olho-o pela janela na face das coisas, recolho-me a mim para meditar também. Há então submersas vozes esparsas que de longe me chamam. Inclino um ouvido na alma para as escutar. Podiam materializar-se num eco, num cão que ladra na distância do vazio, no ruído de um motor perdido. Nada ouço. Apenas o vento balança ao alto e a lua medrosa se esconde por entre a neblina. Fico a olhá-la na memória de nada, na imagem que se me insinua de uma saudade vã de tudo o que me saúda de longe, do espaço da juventude como um diadema de luz lunar. Hora da nulidade do mundo. Aí estou. Aí sou.
Led