quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

A leira...


...dos saudáveis. Começa logo pela adolescência. É um ajuntamento fundamentalista como a dos grupos de jovens cristãos, dos femininistas, das testemunhas de Jeová, dos positivistas ecológicos da Oprah, dos comunistas e bloquistas e assim. Não beber, não fumar, evitar a carne, o café, os doces e sobretudo as gorduras saturadas, lavar as mãos 30 vezes ao dia, dar preferência aos vegetais e às frutas, comer pouco e várias vezes ao dia mesmo sem apetite, beber muita água (ou não, segundo os novos rigorosos cálculos científicos), deitar cedo e cedo erguer, fazer exercício, evitar o sedentarismo, vigiar o peso, a glicémia, a tensão arterial... São vegetarianos, ou macrobióticos, ou não comem carne ou não bebem refrigerantes ou cerveja. Todos os alimentos são canonizados ao grau de medicamentos e sabem de cor toda a nomenclatura nutricionista calórica, e vitamínica. Prostram-se submissos à mais pequena divindade anti-oxidante. Estão por isso atentos aos mais recentes desenvolvimentos da indústria médico-cosmética nas revistas disponíveis ao grande público e especializadas para cada sexo e para cada idade. Anestesiam a mais pequena ameaça de incómodo físico. Não se enervam, não levantam a voz, não discutem. Gostam de conversas calmas, de sentimentos controlados, de comida sem cheiro... São filhos da nova geração do dogma da ciência e do corpo. Gente insípida, espalmada e incontestável...impossível descuidarem na sua cruzada messiânica pelo mundo com boas intenções e desígnios de vida... Acreditam na possibilidade de um mundo perfeito, sempre a verdade mais perigosa para a existência humana. É verdade que eles estão certos e viverão mais 5-10 anos do que os outros, monte depressivo e abjecto de vícios, pecados, defeitos e excessos. São felizes na sua maneira controlada e inexcedível. Sim. Sim. Sim. Mil vezes sim. Ou talvez não. Depende do que recomenda o “Haja Saúde”! Mas para é que querem a vida, se não é para a usarem? Lembram os que compram livros mas guardam-nos na estante para não sujarem as folhas. O seu objectivo na vida não é viverem-na mas cifrar a felicidade ao simples facto de a conterem. São exemplares à vista – magros, direitos, correctos, musculados, impolutos. Glória ao culto do corpo! Mas não tiram proveito disso, excepto o de serem saudáveis à custa de muito calvário. Ou seja, de poderem gozar a vida na sua maior extensão, que apenas é poder. A leira dos saudáveis. Vejo-os com frequência eufóricos e exuberantes pela TV. Mas baixo-lhes o volume e ficam logo mais achacados.


E agora vou dormir, queria evitar as olheiras.


Led

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