domingo, 6 de maio de 2007

Cidade perdida

Recordo a monumental serenata transmitida na rádio na passada quinta-feira....E uma àspera melancolia dilacera-me não sei de onde. Vem a lamentação do nunca mais, ó estúpida Coimbra da estúpida juventude. Não a Coimbra do imediato e do dia-a-dia couraçado para a comoção ou a Coimbra da folia estudantil convencional e estereotipada mas a Coimbra pessoal do mito e do sem tempo e portanto indizível e imemorável. ...não a recordação para uma dimensão prática mas o que acede à evocação e que portanto sucumbe à emoção trespassando o mundo do domínio real. Do passado que se nos abre legendário na furtiva irrealidade que as nossas mãos não dominam. Abre-se o espaço rarefeito de mim. É o espaço da vertigem e da alucinação. Como explicar que nunca reencontrarei a cidade do sonho bebido que procuro e sinto apenas na evocação e na sua transcendência ... Que sentirão numa balada de Coimbra os que nunca por lá passaram? Porque toda a música se organiza com o passado, entremeando-se-lhe para o organizar. Uma balada de Coimbra é para mim sobretudo a imensidão do seu céu longínquo, aberto ao espaço da irradiação dessa balada. Coimbra é do imaginário e só assim depois de morrer ela nasce. Há portanto que recriá-lo no irreal que é o seu. O que existe na Coimbra legendária é o seu impossível, a eternidade da memória, o imóvel desse passado que é a transcendência do passado real que nunca existiu. Vibram as cordas no tempo, reboam num vasto céu ausente. Esta ressonância, esta vibração, esta estridência....Meu Deus. Que me é toda a especulação e problemas e sonhos? Uma guitarra retine, ecoa na distancia da minha alegria morta. Ouço-a e tudo em mim se desvanece no aéreo desta noite, uma mão erguida faz-me sinais de uma distancia de vertigem. Os acordes de guitarra ressoam ao espaço do universo. E eu sou nele como no refúgio derradeiro, como na serenidade de um profundo esquecimento, verdade única e final, saldo de uma vida para sempre . Ouço apenas, ouço. E foi só o que me ficou desse enigma para sempre inabitável- uma toada plangente dessa cidade perdida...
Led

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