sexta-feira, 13 de julho de 2007

A religião da paz no seu melhor


A polémica continua passados quase 20 anos...

Em 1988 o escritor indo-britânico Salman Rushdie publica o livro "Versículos Satânicos" em que seria “ofendida” a religião islâmica. De acordo com a lenda, Maomé adicionou versos ao Corão admitindo (além de Alá) três deusas que seriam anteriormente veneradas em Meca como seres divinos. Ainda segundo a lenda, mais tarde Maomé revogou estes versos, dizendo então que o diabo (o próprio!) o tinha aliciado a incluir estas linhas para satisfazer os Mecas. Contudo, no livro ficcionado o narrador revela ao leitor que estes tais versos polémicos teriam de facto origem no Arcanjo Gabriel e não em Satanás...
E de imediato cai o “Carmo e a Trindade” (antes fosse) no mundo muçulmano! ”Blasfémia contra o Islão”! “Fatwa”! Em face disso, o tarado do Khomeini do Irão (o respeitável líder espiritual da altura) condenou à morte o escritor, que vivia na Grã-Bretanha, prometendo mesmo a recompensa de quatrocentos e tal mil contos a quem o executasse. E a mesma sentença de morte estender-se-ia aos editores que publicassem o livro. Nessa altura, muçulmanos de todo o mundo apelaram à sua rápida execução. Editores seus foram atacados à bomba de Inglaterra à Califórnia. O editor japonês foi assassinado, e o norueguês saiu gravemente ferido de um atentado. Muitas mais pessoas morreram em conflitos pelo mundo muçulmano. O livro foi queimado em autos-de-fé em sítios tão improváveis da África do Sul ao Reino Unido e EUA. Por causa disto o Irão chega mesmo a quebrar relações diplomáticas com o Reino Unido durante meio ano.
Todo o mundo ficou siderado. Como é que no nosso tempo era possível condenar-se alguém à morte por motivos religiosos? Decerto poderia ser grave ofender-se a sensibilidade de um crente. Mas em que tempos estaríamos nós para ser possível pagar isso com a vida? E sobretudo como era possível que um louco criminoso se permitisse mandar executar alguém fora do seu país. Como se tinha a desfaçatez de alargar a países estranhos a sua acção judiciária?

Rushdie nunca chegou a ser distinguido com o Prémio Nobel porque a Academia Sueca nunca se atreveu a afrontar o Islão. A perseguição arruinou a sua vida pessoal, obrigando-o a viver clandestino e protegido pelos serviços secretos britânicos durante nove anos. Uma das consequências dessa reclusão foi ter sido abandonado pela segunda mulher, a escritora Marianne Wiggins. E acabou por definir o exílio, pois Rushdie mudou-se para Nova Iorque. Há poucos dias, em reconhecimento da sua obra literária, a rainha de Inglaterra fez dele cavaleiro, decisão que o Conselho Muçulmano da Grã-Bretanha considerou “uma afronta”.

Curiosa situação esta. Só no passado a fé ia a África e ao Oriente matar mouros. E são eles agora que repetem a malfeitoria da questão. E é toda esta confusão que ainda nos deixa siderados 500 anos depois das nossas arremetidas. Onde estávamos nós que tínhamos anulado o poder religioso? Que nos arrepiávamos com os crimes da Inquisição? Que os integrávamos, quando muito, na óptica de há séculos? Que a julgávamos impossível neste início do terceiro milénio? Porque é como se descobríssemos um exemplar de uma espécie já extinta há milhares de anos. Ou mais. Mas sobre tudo o que nos desvaira de assombro é que exista ainda uma religião, disseminada pelo Mundo, que possa chamar a si um projecto de domínio temporal, que possa trespassar praticamente todos os islâmicos de uma crença religiosa em tempos de agnosticismo ao ponto de fazer disso uma arma de extermínio e muito possivelmente de expansionismo.

Há um mês, no Paquistão, o ministro dos Assuntos Religiosos lembrou ao Ocidente que é este tipo de “atitudes” que justifica o terrorismo: «If someone commits suicide bombing to protect the honour of the Prophet Muhammad, his act is justified.».

E é este o horror que de todo o modo vamos acabando por admitir, com medo de represálias e de epítetos islamofóbicos!

Led

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